"A calmaria
chegou até ele como uma cruz cravada em seu peito. Foi tudo ruindo
vagarosamente, como se provocado por um efeito dominó. Logo não existiam mais
as casas, ladeadas por estreitas calçadas, e nem ao menos a balbúrdia dos
comerciantes e transeuntes que antes por ali ficavam. Acabaram-se as luzes, a
música, e os coretos de domingo. Aquilo sim era uma cidade cinza e adormecida. E
assim ele percebia através de seus olhos castanhos, como a paz também podia ser
um tanto opressiva, e por vezes, solitária.
Estava ali,
parado em pé, quieto, apenas sentindo a brisa correr por seus cabelos, enquanto
analisava o imenso silêncio que havia dentro de si. Um silêncio que gritava por
socorro. Sentia-se perdido dentro de si mesmo, como se tivessem tirado seu
propósito de vida. Vendo tudo aquilo concluiu que se chegara até ali era graças
a um milagre. Queria saber para onde tinham ido as explosões, os clarões, o
cheiro de pólvora e a cantoria dos fuzis. No fundo, não sabia o que pensar e
nem o que sentir. Apenas queria sair correndo e voltar para a batalha, pois se
fosse pra morrer que morresse então lutando por algo.
Era muito louco
tudo aquilo: quando se achava uma razão, algo logo se perdia de novo. E assim
ia. Cada minuto ia ficando cada vez mais insuportável, como se o obrigasse a
lembrar-se dos seus companheiros mortos em combate. Dezenas deles, aliás. Então,
cansado de tantas lembranças que não serviam de nada, sentou-se no momento
seguinte, já fatigado pelas horas sem propósito. E por incrível que pareça não
se sentia culpado. Não havia motivos para isso, pois se sentia um pouco morto
também. E assim o tempo ia se arrastando, e a noite se aproximava como um lobo
faminto. Densas nuvens faziam o céu ficar carregado e pequenas gotículas de
chuva começavam a cair. Assim, resolveu deixar-se influenciar pelo escuro que
vinha até ele, abraçando aquele infinito que era só dele. Acendeu um cigarro, e
resolveu não pensar em mais nada.
Aprendera que a esperança chega nas horas
mais inoportunas."
Camila Carelli
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