domingo, 14 de abril de 2013

  

Estandarte II


 I
 
Subi, muitas vezes, àquela montanha esparsa
Caminho enevoado pelo semblante de um sol ardente
Rubros pássaros, recantos resguardados
Só, ao grito de uma nesga intrépida nevasca
E me ceguei, me cegaram, naquele prisma ambivalente.
 
Minha vida corria numa espiral louca, e,
Logo me fechei apertado,
Naquele grito sufocado por todos os passos noturnos.
 
Correntes de ínfimas dúvidas, sobressaltado no meio da noite,
Mãos de pedra, coração gelado, destino tenebroso
Assombravam-me os pingos de chuva, gelados e aflitos na pele
Vivia, eu, na sombra dos meus temores, sim,
Um jazigo coberto dentro de mim mesmo.
 
No embalo pausado desta perseguição
Não ouso sentir o bolso, no qual
Estão bem resguardadas as balas da minha caçada
Ó, alvorada bélica!
Céu turvo, sulcos e trilhas ambíguas!
 
Roubam-se os corações famintos
Trancafiados na asa da águia
Alinhados ficam os canhões
Que por desatino alucinam a alma
 
                   
 II
 
Agora, clarinetas estouram nas trilhas da noite, e
o céu desperta talvez em nova alvorada
Mas eu, aqui, assusto-me com a cantoria
Ao longe dos trompetes macabros.
 
Aviva-me, ó azul do Estandarte ao Sul!
Ó, ira profunda dos meus abismos!
Vermelho do Estandarte ao Sul!
Fortalezas desse oceano imenso!
 
Escuta, agora, a honra despertar, e
O ritmo borbulhante das armas...
Perfurando o ar, alçando almas ao Senhor
O replicar das bombas nesta terra enferma
Fecundando o chão com este sangue moribundo
Guerreiros, vós sois!
 
                   
III
 
Um novo capítulo rente ao espaço
Descompassos de fé
Decisões de antemão
 
Fácil agora seguir pela curva,
Trilhas angulares
Uma pedra a desviar pelos calcanhares
 
Pois me vem a visão do morto
De encontro à minha face translúcida
Sem robustez, quadros de cor
E que assim ficou sem luz
 
Não é a morte, que
Encontra-me depois
É ela, o clarão da vida
Um risco de sombra em mim
 
Acordo! Um júbilo para teus lábios
Felicitá-la pelos teus temores
Unidos neste eterno já soído
Não mais o encontro da própria voz
 
                   
 IV
 
Em suma a minha história
Meu caminho à própria morte
Remanso de cristais
Sozinho, a solitude no meio da noite
 
Pois que me acompanhará o clarão do fuzil,
Uma bala me espicaça e fere
Um jorro de sangue anil, que
Estampa esta pele de silício
 
Um silvo me recurva
Penso: -Adeus, Mabelle!
E cimento ao chão
Com o peso deste corpo,
De soldado não alforriado
 
Só digo-lhes: - Não retalhem esta face moribunda
Eterno ser, em cores sombreadas
Cabelos revoltos, pele terrena
Ritmo calculado na multidão do exército
Porque mais tarde eu volto a ser o capitão dos exilados!
 
                   
 V
 
Agora eu percebo as desventuras a que ameaço
Onde jaz o obelisco dos meus afazeres
Confesso, sim, o martírio da guerra
Das manifestações descabidas
Da amargura inegável, o ódio epidêmico
Ah, a minha alma implora aos céus!
Piedade desta criatura peregrina
Que soa o clarim, que faz somente o que não quer
Ah, guerreiro! Luz divina sobre ti, Barbosa!
 

*Esta poesia foi selecionada para compor a antologia do V Prêmio Canon de Poesias (2012), organizado pela Fábrica de Livros (do grupo editorial Scortecci), em parceria com a Canon do Brasil.

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